Batizados de nômades digitais, esta nova geração de adultos uniu a tecnologia e o desapego para criar um novo projeto de vida.


Quem são os catarinenses que vivem e trabalham viajando pelo mundo Leo Munhoz/Agencia RBS
Otaviano e Vanessa deixaram Joinville em janeiro para 
dar a volta ao mundo de Kombi.

Foto: Leo Munhoz / Agencia RBS.


Neste momento, Otaviano e Vanessa se dirigem em direção ao Sul do Brasil, Acauã e Taline pedalam para atravessar o país e Michelle e Roy encaram a estrada rumo ao Norte da Rússia. Em comum, os três casais tem o berço catarinense: os dois primeiros partiram de Joinville, enquanto Michelle e Roy deixaram São Bento do Sul para viver uma aventura que torna-se cada vez mais comum, principalmente para uma nova geração de jovens adultos.

Se, até pouco tempo, sair pelo mundo a bordo de um trailer ou um motor home parecia possível apenas depois da aposentadoria, a tecnologia e as novas formas de trabalho permitem que este projeto de vida aconteça mais cedo.


 

Michelle F. Weiss, 31 anos, e Roy Rudnick, 41, (foto ao lado) já são veteranos na estrada. Eles "largaram tudo" em 2007 para fazer a primeira expedição, batizada de Mundo por Terra, viajando e vivendo dentro de um motor home. Foram quase três anos para alcançar o objetivo de dar a volta ao mundo, dirigindo por 160.733 quilômetros e cruzando 60 países dos cinco continentes.

Mas, ainda que a maioria das pessoas utilize a expressão "largar tudo" ao referir-se a este movimento, na vida de Michelle e Roy significou muito mais "abraçar tudo". Antes mesmo de retornarem ao ponto zero, em São Bento, eles sabiam que a rotina comum não seria mais suficiente.

— Era difícil de pensar que não teríamos uma oportunidade de ficar tanto tempo na estrada novamente. Por isso, ainda antes de chegarmos em casa, dissemos a nós mesmos que iríamos fazer mais uma volta ao mundo no futuro — afirmam eles, que, em agosto de 2014, deram início à segunda volta ao mundo, intitulada Latitude 70º, com o objetivo de atingir a latitude 70º Norte em três pontos do globo: Alasca, Noruega e Rússia.

Entre as duas viagens, Michelle e Roy lançaram o livro Mundo por Terra, contando a experiência, em 2013. Alguns meses depois, Otaviano Marques Pereira de Oliveira, 30 anos, e Vanessa Monnier Corrêa, 26, compraram a obra sem conhecer nada sobre a história de Michelle e Roy.

Foi o ponto de partida para que um novo casal escolher este projeto de vida, que teria início dois anos depois da compra do livro — mais precisamente, no último dia 21, depois de uma festa de despedida na praça do Mercado Público Municipal de Joinville.

— Não é como se nossos empregos fossem ruins ou algo do tipo, mas a gente estava sentindo que precisava de alguma coisa a mais, de uma coisa diferente — explica Otaviano, desmistificandoa ideia de que viajar pelo mundo é uma fuga da frustração na carreira ou na vida familiar.

O casal pretende passar o ano de 2016 vivendo no Brasil, mas em um lugar diferente toda semana. Para terminar o trajeto planejado, mais três anos de estrada virão em viagens por outros países e continentes.

Um sonho possível.

Deixar a casa e o trabalho para viver na estrada pode parecer uma meta inalcançável, destinado apenas para poucos privilegiados que podem tirar não apenas um, mas vários anos sabáticos, sem preocupações com dinheiro para pagar as contas. Mas, enquanto realizam este percurso, tanto Michelle e Roy quanto Otaviano e Vanessa não param de trabalhar.

Otaviano e Vanessa juntaram a poupança às economias dos dois anos de planejamento e, dessa forma, conquistaram o suficiente para viver o primeiro ano da aventura. O orçamento para os anos seguintes terá que ser conquistado ao longo do tempo e, para isso, eles adaptaram a nova rotina às possibilidades de prestações de serviços com equipamentos de fotografia e filmagem que eles levam para registrar a volta ao mundo.

Eles ainda conquistaram o direito de captar recursos via Lei Rouanet para a produção de um documentário já batizado de O Mundo sob uma Nova Perspectiva, no qual eles irão apresentar os patrimônios culturais e naturais da humanidade classificados pela Unesco sob um novo ponto de vista, com a ajuda, por exemplo, de um drone com câmera.

— Nós abrimos uma empresa e desenvolvemos uma série de projetos — conta Otaviano.

— Temos alguns patrocinadores pequenos, que dão apoio, material, mas também estaremos trabalhando com o drone, com serviços que podem ser trocados, por exemplo, pela estadia em um camping — completa Vanessa.

No caso dos viajantes que partiram de São Bento do Sul, a primeira experiência não foi tão simples: eles precisaram utilizar as economias e depender delas e da venda de alguns itens pessoais para bancar o projeto.

Já na segunda viagem, com muitos fãs na bagagem para provar o potencial da expedição Mundo Afora, conquistam o patrocínio da Interbrasil e de outros apoiadores — mas, é claro, continuam cobrindo custos do dia a dia com as economias da venda de livros, palestras e exposições de fotos que fizerem entre a primeira e a segunda viagem.

Na bagagem, o desapego.

O momento, também, é de desprendimento: quem decide viver este projeto de "nômade moderno" precisa saber que o dia a dia será sem luxos e rompantes de consumismo. Optar por este estilo de vida significa uma rotina de baixo custo, compensada pela oportunidade de acordar diante de cenários deslumbrantes, em um lugar diferente a cada semana.

Além disso, compartilhar é uma palavra-chave: serviços de hospitalidade como o couchsurfing, no qual os moradores abrem suas casas para os viajantes, torna a experiência um verdadeiro intercâmbio cultural.




Em termos de desapego, os joinvilenses Acauã Auer Rolim, 23 anos, e Taline Schroeder Rolin, 25, (foto ao lado) vivem o estágio mais puro: há cerca de um mês, eles deram início a uma viagem até o Canadá de bicicleta. Isso significa que só podem levar na mala aquilo que cabe no bagageiro deste meio de transporte, contando aí a barraca e os sacos de dormir.

Nestes 30 dias de estrada — que o levam, primeiro, até o Sul do Brasil — o casal ainda pode contar, por vezes, com hospedagens em casas de conhecidos e parentes, mas, em outras noites, o jeito foi pedir para utilizar o quintal de desconhecidos para montar acampamento.

— Contamos com a confiança e generosidade de desconhecidos. Batemos palma ou tocamos a campainha, explicamos a respeito da viagem e pedimos pra acampar no quintal. A escolha de confiar em alguém, mesmo desconhecido, proporciona que o amor seja cultivado — avaliam. 

Acauã e Taline não tem um prazo definido para cruzar as fronteiras ou chegar ao outro extremo do continente americano. O percurso foi decidido com pesquisas sobre as estações do ano em que é ideal estar — ou não — em cada região. No entanto, o plano é pedalar pelo menos mil quilômetros por mês, que podem mudar de acordo com o que acontecer no caminho.

Como nesta situação fica mais difícil trabalhar, eles não chegam a se enquadrar no termo nômades digitais. Para viver esta experiência, os jovens apostam nas economias e em uma parceria com uma cafeteria da cidade. O fato de fazer a viagem de bicicleta — que não depende de combustível nem de equipamentos — também foi definidor.

— Como já tínhamos um estilo de vida simples conseguimos economizar um pouco a cada mês. Isso sempre fez parte da nossa maneira de administrar as finanças — afirmam.

Fontes de inspiração:

Vivendo Mundo Afora.

Viajantes: Otaviano e Vanessa.

Destino: Dar a volta ao mundo entre 2016 e 2020.

Veículo: Kombi.

Foco: Produzir documentários para manterem-se na estrada enquanto conhecem o mundo e registram os patrimônios da humanidade sob nova perspectiva.

Onde encontrá-los: No site vivendomundoafora.com.br, no Facebook, Youtube, Instagram, Snapchat.


AmorBikeCafé.

Viajantes: Acauã e Taline.

Destino: cruzar o continente americano até o Canadá.

Veículo: bicicleta.

Foco: Pedalar até o Canadá enquanto conhecem outras culturas.

Onde encontrá-los: Facebook e Instagram.

Mundo por Terra.

Viajantes: Roy e Michelle

Destino: dar a volta ao mundo e passar por todas as latitudes 70º.

Veículo: motor home.

Foco: Rodaram o planeta em um veículo automotor Land Rover 130 nos anos 2007, 2008 e 2009. Em agosto de 2014, partiram novamente em sua segunda volta ao mundo, agora, com o Projeto Latitude 70, e continuam na estrada.

Onde encontrá-los: No site mundoporterra.com.br, no livro "Mundo por Terra" e no Facebook.

Fonte: Cláudia Morriesen / claudia.morriesen@an.com.br / Jornal A Notícia / Comportamento.

Casal de Santa Catarina começará viagem de volta ao mundo em 2016.


Eles se mudarão para uma kombi, que será adaptada para virar uma casa sobre rodas / Salmo Duarte/Agencia RBS.


Casal de Santa Catarina começará viagem de volta ao mundo em 2016 Salmo Duarte/Agencia RBS

                      Carla e Marcelo querem conhecer o mundo e a cultura a fundo.

                                   Foto: Salmo Duarte / Agencia RBS.


Marcelo Silva e Carla Frank querem mudar de endereço em 2016. Eles também querem viajar. Parecem planos comuns de ano novo, se não fosse por um detalhe: aliarão os dois desejos em um e darão a volta ao mundo.

O casal — ele natural de Brusque, ela de Joinville — deixarão o apartamento em Balneário Camboriú e passarão a viver dentro de uma kombi, a Rita Lee, que está sendo preparada para virar residência pelos próximos anos. Talvez, se os conselhos que Marcelo e Carla já ouviram de outros viajantes estiverem certo, a mudança pode ser para sempre.

— Muita gente, ao falar dos nossos planos, chama de viagem. Mas não é uma viagem, é uma mudança de vida — analisa Marcelo — E quem já está vivendo assim nos contou que também começou pensando em data para voltar à "vida normal", mas o prazo passou e eles quiseram continuar na estrada.

O projeto, que eles batizaram de Mundo em Verde e Amarelo, começou a ser planejado há cerca de quatro anos. Foi o período necessário para transformar o que era sonho em planos concretos, adquirindo conhecimento, fazendo contatos e esperando os filhos tornarem-se adultos. Além disso, havia uma certeza quando decidiram dar a volta ao mundo: ela seria de kombi.

A primeira foi a Jujubinha, um modelo "corujinha" 75 que, depois de passar por restauro, precisou ser vendida para arcar com despesas financeiras inesperadas. Agora, a companheira de viagem será Rita Lee, modelo 2002, uma das últimas a ter motor 1.6 refrigerado a ar, que mantém a nostalgia do projeto com menos riscos.

— A escolha da kombi também teve a ver com a questão financeira, já que as peças são baratas e podem ser encontradas em qualquer lugar do mundo; e o motor é simples, então eu posso consertá-lo sozinho — conta Marcelo.

O que eles não esperavam é que o veículo escolhido garantisse o sucesso precoce do projeto. Três meses após criarem a página Mundo em Verde e Amarelo no Facebook, já haviam conquistado 5 mil curtidores. O número agora já chega a 10 mil — e a viagem ainda nem começou.

O casal deve este sucesso aos apaixonados pela marca que existem no mundo inteiro, o que garantiu também convites de hospedagem em diferentes países e até um guia voluntário pela Turquia. O país euro-asiático, no entanto, terá que esperar: a intenção é passar o primeiro ano no Brasil, conhecendo o próprio país para valer.

— As pessoas viajam para o Nordeste, ficam em hotéis e resorts e acham que conheceram aquela região. O que queremos é aproveitar o máximo de cada lugar, fazendo roteiros alternativos àqueles do turismo, para conhecer a cultura a fundo — diz Carla.

Um mito que Marcelo e Carla ainda encontram dificuldades para derrubar ao falar do projeto é de que eles precisam ser ricos para cometerem a ousadia de querer cruzar o planeta de carro. A verdade é que, como não é uma simples viagem, eles não estarão em férias eternas. Marcelo, que é publicitário, já começou a migrar o contato com os clientes para o mundo virtual; Carla, que é bióloga, atua há seis anos como agente de turismo, e também conta com a internet como escritório.
— Estaremos viajando o tempo todo, mas não deixaremos de trabalhar. A diferença é que estaremos em uma casa "bem pequenininha", mas com um quintal gigante: o mundo inteiro — afirma Carla.


Para viajar junto.

A partida da kombi Rita Lee com o Projeto Mundo em Verde e Amarelo está prevista para abril de 2016. Até lá, um projeto de financiamento coletivo pretende arrecadar contribuições a partir de R$ 10 para adaptar o veículo com sistemas de isolamento térmico, necessários para lugares muito quentes ou muito frios, e outros itens necessários à montagem de uma casa sobre rodas.

Para colaborar, acesse o projeto Mundo em Verde e Amarelo no site Kickante, as contribuições terão recompensas de acordo com o valor.


Quem quiser acompanhar o projeto, pode acessar:

Facebook - www.facebook.com/mundoemverdeamarelo.
Blog - http://mundoemverdeamarelo.com/